Ao longo do século XX e início do XXI, poucos nomes brilharam com tanta constância e luz na seara espiritual quanto o de Divaldo Pereira Franco. Herdeiro do legado moral e mediúnico de Chico Xavier, sua atuação incansável como médium, educador, orador e pacificador fez dele uma das colunas vivas do Espiritismo no Brasil e no mundo. Em tempos de crise espiritual e esvaziamento das práticas religiosas tradicionais, Divaldo representou a continuidade ativa do Evangelho à luz da razão, oferecendo ao movimento kardecista uma nova voz e uma presença serena capaz de orientar consciências em profunda transformação.
O Nascimento de um Espírito Comprometido
Divaldo nasceu em 5 de maio de 1927, na cidade de Feira de Santana, no interior da Bahia, terra mística, musical e profundamente marcada pela religiosidade popular. Desde muito jovem, demonstrou traços singulares de sensibilidade e percepção, convivendo com fenômenos espirituais e visões desde a infância. No entanto, sua trajetória não foi marcada por facilidade: enfrentou profundas dores emocionais e perdas que moldaram a compaixão e a fé que guiariam toda a sua missão.
Ainda na juventude, experimentou um sofrimento extremo com a perda de entes queridos e, posteriormente, foi acometido por uma enfermidade moral, como ele mesmo relata, chegando ao limite do desespero. Foi neste ponto que teve um contato mais profundo com os ensinamentos espíritas e, sobretudo, com seu mentor espiritual Joanna de Ângelis, entidade que o acompanharia ao longo de toda a vida como guia, conselheira e fonte de inspiração literária.
O Início da Missão Mediúnica
Nos anos 1940, Divaldo abraça publicamente a causa espírita. Ainda jovem, muda-se para Salvador, onde inicia seu trabalho social e espiritual com uma clareza e propósito que rapidamente chamaram a atenção dos centros espíritas e da comunidade local. Foi nessa fase que Divaldo começou a psicografar suas primeiras mensagens e a realizar palestras públicas, sempre pautadas por uma linguagem clara, elegante e profundamente elevada, mesmo para temas delicados da alma humana.
Ao contrário do estilo simples e rural de Chico Xavier, Divaldo assumiu uma postura intelectual refinada, dialogando com psicologia, filosofia e literatura universal, sem jamais abandonar os princípios evangélicos do amor, da humildade e da caridade. Essa característica tornou sua atuação essencial na intelectualização do Espiritismo brasileiro, preparando-o para dialogar com universidades, mídias internacionais e plateias exigentes do século XXI.
A Mansão do Caminho: Amor Encarnado em Ação
Se há um legado concreto que traduz a alma de Divaldo, é a Mansão do Caminho, fundada em 1952, em Salvador. Mais do que uma obra social, trata-se de um verdadeiro santuário da dignidade humana, onde mais de 40 mil crianças já foram acolhidas, cuidadas, educadas e preparadas para a vida com dignidade.
A Mansão é um dos maiores centros de assistência integral do país, funcionando como creche, escola, clínica médica, centro educacional e templo espiritual. Tudo isso foi construído sem apoio estatal direto, mantido com doações e o trabalho voluntário de milhares de corações tocados pela luz da missão de Divaldo.
Ali, o Espiritismo se faz Evangelho Vivo: o pão, a palavra, o remédio e a ternura se fundem num só gesto de amor.
O Orador da Paz: Divaldo no Brasil e no Mundo
Divaldo não se restringiu ao Brasil. Ao longo de mais de 70 anos de missão, realizou mais de 15 mil conferências em mais de 70 países, sempre levando a mensagem espírita com amor e universalismo. Tornou-se respeitado até mesmo por líderes de outras tradições religiosas, incluindo católicos, evangélicos, budistas e humanistas seculares.
Em fóruns da ONU, universidades na Europa, congressos na América Latina, Divaldo sempre defendeu a paz, a reencarnação, o amor como força regeneradora, a mediunidade ética e a educação da alma. Sua capacidade de oratória, com voz firme e palavras precisas, aliava conteúdo profundo à leveza emocional, tocando o coração mesmo dos céticos.
Recebeu diversos prêmios e homenagens internacionais por seu trabalho como pacifista, inclusive títulos de doutor honoris causa, medalhas da paz e comendas civis em países como Portugal, França e Japão. Sua figura tornou-se símbolo de espiritualidade ativa e tolerância universal.
Após Chico Xavier: O Guardião da Luz em Tempos de Transição
Com a desencarnação de Chico Xavier em 2002, o movimento espírita brasileiro enfrentou um momento delicado. Para muitos, Chico era insubstituível e de fato o foi em sua doçura, carisma e conexão com o povo simples. No entanto, a continuidade da doutrina não podia depender de uma única figura.
Foi então que Divaldo Franco, já amplamente reconhecido, assumiu com discrição, firmeza e humildade o papel de referência moral e intelectual do Espiritismo no Brasil. Sem jamais reivindicar liderança ou protagonismo, ele se tornou o ponto de equilíbrio entre tradição e renovação, espiritualidade e razão, consolação e estudo.
Sua atuação após a morte de Chico foi marcada por dois gestos fundamentais:
Manter viva a vibração do Cristo em movimento, centrando o Espiritismo na ética, no acolhimento e no serviço incondicional.
Ampliar o diálogo do Espiritismo com a ciência, a psicologia e a espiritualidade universal, atualizando sua linguagem sem deturpar seus princípios.
Por isso, muitos estudiosos o chamam de “o elo entre a Era de Chico e a Era da Transição Planetária”, reconhecendo em sua figura uma continuidade silenciosa, mas poderosa.
As Obras Psicografadas: Joanna de Ângelis e a Psicologia do Espírito
Divaldo não foi apenas orador: foi e é um dos maiores médiuns psicógrafos do mundo. Ao longo da vida, publicou mais de 250 livros ditados por espíritos diversos, totalizando dezenas de milhões de exemplares vendidos, muitos dos quais traduzidos para mais de 20 idiomas.
O destaque absoluto entre suas obras psicografadas está no conjunto de mensagens de sua guia espiritual: Joanna de Ângelis. Trata-se de uma entidade feminina elevada, identificada com a tradição do cristianismo primitivo, profundamente ligada à figura de Teresa d’Ávila, e considerada uma mestra espiritual da humanidade.
Joanna trouxe, por meio de Divaldo, uma profunda síntese entre Espiritismo, Psicologia e Autoconhecimento, abordando temas como:
Ego, sombra e individuação espiritual
Trauma, infância e cura interior
Espiritualidade nas relações afetivas
A educação da alma para o século XXI
Conflitos existenciais, neuroses, culpa e transcendência
Obras como “Jesus e Atualidade”, “O Homem Integral”, “Desperte e Seja Feliz” e “Autodescobrimento” tornaram-se verdadeiros tratados de psicoterapia espiritual, influenciando terapeutas, educadores e buscadores em todo o mundo.
O Educador da Alma
Mesmo diante de multidões, Divaldo jamais se distanciou da simplicidade amorosa. Ao entrar num centro espírita, sentava-se com crianças, escutava idosos, conversava com humildade. Esse traço o consagrou não apenas como orador, mas como educador da alma humana.
Sua fala sempre evitou fanatismos, acusações ou dogmatismos. Preferia usar parábolas, poesia, metáforas, histórias comoventes e sempre convidava à reflexão silenciosa, ao perdão mútuo, à vigilância moral e à caridade discreta.
Mesmo diante das dores do mundo, jamais se afastou da fé. Falava da morte com ternura, do sofrimento com serenidade, da sexualidade com respeito e da vida espiritual com lucidez. Nunca usou o Espiritismo como instrumento de vaidade ou controle. Foi, até o fim, um servo da luz.
O Legado Espiritual
Divaldo deixa como herança uma multidão de corações transformados. Não apenas os órfãos acolhidos na Mansão do Caminho, ou os leitores de suas obras, ou os ouvintes de suas palestras, mas principalmente os espíritas silenciosos, anônimos, que aprenderam com ele o valor do trabalho sem aplausos, da fé sem imposição, da bondade sem palco.
Se Chico Xavier representou o coração do Espiritismo, Divaldo foi a voz e a consciência do século XXI, uma figura conciliadora, sábia, universal, devotada à missão de construir o homem novo.
Os Últimos Anos: A Serenidade do Retorno
Nos últimos anos de sua vida, Divaldo diminuiu o ritmo das viagens e palestras internacionais, mas jamais cessou sua presença espiritual. Ainda ativo, mesmo com a saúde fragilizada, continuava escrevendo, orientando os trabalhos da Mansão do Caminho e participando de eventos com presença online ou reduzida.
Seu olhar permaneceu o mesmo: doce, firme, lúcido. Sua voz, embora mais pausada, mantinha o timbre de paz que tantos reconheceram ao longo das décadas. Sabia que sua missão se aproximava do fim, mas nunca mencionava isso com pesar. Ao contrário, falava com leveza sobre a desencarnação como um retorno ao lar, uma mudança de plano, não um fim.
A sua morte, ocorrida em maio de 2025, coincidiu com o mês de seu nascimento e foi recebida, nos planos físicos e espirituais, como a passagem de um emissário que cumpriu tudo o que lhe foi designado com plenitude. Não deixou lacunas: deixou sementes.
Uma Homenagem Esotérica a Um Espírito Solar
Divaldo não era apenas um médium. Era, em essência, um instrutor silencioso de almas, que atravessou quase um século levando luz onde havia desamparo, escuta onde havia desespero, consolo onde reinava a dor.
Sua encarnação parece ter sido planejada com precisão espiritual para dar continuidade ao trabalho de Chico Xavier e preparar a nova geração para os desafios da Transição Planetária. Enquanto Chico abriu o coração do povo, Divaldo elevou a consciência das mentes, promovendo um Espiritismo mais maduro, profundo, universalista e compassivo.
Ele caminhou entre nós como um peregrino da verdade, vestindo o manto da humildade, carregando o fardo do serviço e distribuindo a luz com mãos invisíveis. Ao retornar ao plano espiritual, certamente foi recebido com música, flores e gratidão, não por títulos ou feitos visíveis, mas pela vibração silenciosa de cada alma que tocou.
Conclusão: O Embaixador da Luz Não Parte — Ele Se Espalha
Divaldo não morreu. Ele se expandiu.
Agora habita cada lar onde o Evangelho é lido com amor. Vibra em cada palavra de consolo que um voluntário oferece. Respira em cada criança da Mansão do Caminho. Sorri no coração de cada espírito que compreendeu, por suas palavras, que viver vale a pena.
Ele não fundou igrejas. Fundou consciências.
E seu maior templo não tem paredes: é o Espiritismo em paz com o mundo, em diálogo com a ciência, em sintonia com o Cristo Vivo.
“A caridade é o sol da alma. E quem faz o bem silencia o próprio orgulho e transforma a dor em bênção.” (Divaldo Franco)